Você já parou para pensar que, hoje, a população com nome sujo no Brasil equivale a mais de três vezes a da região metropolitana de São Paulo, que é a maior da América Latina e uma das maiores do mundo? Pois é: com 70 milhões de inadimplentes, o Brasil atinge um recorde histórico que impacta diretamente na vida de quem trabalha com recuperação de crédito.
Enquanto você analisa suas carteiras de cobrança, o paradoxo se revela: mesmo com mercado de trabalho aquecido e renda média recorde de R$ 3.410,00, seus clientes continuam sem conseguir quitar suas dívidas. Este cenário exige que você, seja gestor de assessoria de cobrança ou que esteja de alguma forma envolvido nesse segmento, repense sobre uma nova abordagem para resultados efetivos.
Em paralelo, temos uma inflação de 5,53% que corrói o orçamento familiar, transformando o cartão de crédito em ferramenta de sobrevivência para compras básicas. Posto o cenário, compreender esta realidade é seu primeiro passo para desenvolver estratégias de recuperação que realmente funcionem no Brasil de 2025.
Além disso, temos uma questão básica: a renda média brasileira, que ainda permanece abaixo da média mundial e de países com características econômicas semelhantes. Enquanto o Brasil supera países como África do Sul e Indonésia, ainda está atrás de nações como México e China em termos de PIB per capita, que ficou em US$ 10.816 em 2024, cerca de US$ 3.600 abaixo da média mundial, estimada de US$ 14.450.
O novo perfil do inadimplente brasileiro
Como vimos, a inflação dilapida o poder de compra e transforma o cenário da cobrança. Mas, afinal, quem realmente são esses 70 milhões de brasileiros que podem estar recebendo ligações e contatos de cobrança diariamente?
Conhecer profundamente esse novo perfil de inadimplente é fundamental para que assessorias e outras entidades do setor superem as metas de recuperação em um mercado cada vez mais desafiador.
O primeiro grupo que você encontra em suas carteiras são aqueles presos na “bola de neve” financeira. São pessoas que contraem novas dívidas para pagar as antigas, em um ciclo vicioso que se agrava a cada mês. Quando você liga para esse cliente, ele provavelmente já recebeu outras cinco ligações de cobrança naquele mesmo dia, tornando sua abordagem tradicional praticamente ineficaz.
O segundo perfil, talvez mais preocupante para sua operação, é formado por brasileiros que usam crédito simplesmente para sobreviver. Aquele cliente que antes atrasava o financiamento do carro, hoje utiliza o cartão de crédito para comprar arroz e feijão. Com a inflação atual, puxada pelo preço dos alimentos, muitas famílias em sua base de dados simplesmente não conseguem fechar as contas sem recorrer ao crédito.
Dentro desse universo, o Banco Central já identificou 14 milhões de “endividados de risco” – um segmento que exige sua atenção especial. São consumidores que esgotaram suas possibilidades de renegociação e comprometem grande parte da renda com dívidas. Quando sua equipe aborda esse perfil com scripts padronizados, o resultado é previsível: promessas de pagamento que nunca se concretizam.
Desafios e oportunidades para assessorias de cobrança
Agora que você conhece os perfis dos inadimplentes em suas carteiras, é hora de enfrentar os obstáculos e identificar as oportunidades.
Com os já mencionados 14 milhões de “endividados de risco” e promessas de pagamento que raramente se concretizam, assessorias de cobrança precisam reinventar suas estratégias para sobreviver neste novo cenário de recuperação de crédito.
O primeiro grande desafio que operações de cobrança enfrentam diariamente é o volume crescente de dívidas consideradas irrecuperáveis. No primeiro trimestre deste ano, foram concedidos mais de R$ 133 bilhões via cheque especial, com juros médios de 134% ao ano. Quando seu operador tenta negociar valores com essas taxas, encontra consumidores simplesmente incapazes de honrar qualquer compromisso.
A inflação persistente, especialmente no setor de alimentos, coloca em posição delicada quem trabalha com cobrança – afinal, está competindo não apenas com outras dívidas, mas com a necessidade básica de alimentação das famílias. Quando o cliente inadimplente precisa escolher entre pagar uma dívida antiga ou garantir comida na mesa, a decisão é óbvia e a negociação está fadada ao fracasso.
Apesar destes desafios, o mercado atual apresenta oportunidades significativas para assessorias de cobrança:
- Volume recorde de crédito: com R$ 4 trilhões em dívidas de pessoas físicas, há muito trabalho a ser feito e valor a ser recuperado.
- Programas governamentais: iniciativas como o Desenrola Brasil abrem portas para parcerias estratégicas com instituições financeiras.
- Novas linhas de crédito: o consignado para MEIs e trabalhadores formais pode gerar uma carteira de 120 bilhões de reais em dívidas.
- Tecnologia como diferencial: assessorias que investem em análise de dados conseguem identificar devedores com maior probabilidade de pagamento.
Estratégias eficazes para recuperação de crédito em 2025
Diante das oportunidades identificadas e dos desafios impostos pelo cenário de 70 milhões de inadimplentes, assessorias de cobrança precisam implementar estratégias inovadoras. O mercado de R$ 4 trilhões em dívidas exige abordagens que vão além das ligações automáticas e cartas de cobrança utilizadas há anos.
A segmentação avançada de carteiras é seu primeiro passo para aumentar a eficácia. Não basta mais classificar devedores apenas por tempo de atraso ou valor devido. Operações de cobrança precisam incorporar variáveis como perfil de consumo, histórico de pagamentos e comprometimento de renda para criar grupos que respondam de maneira similar às ações de cobrança.
Para clientes que usam crédito para consumo básico, é preciso rever abordagens agressivas. Quando um operador insiste em valores integrais para quem mal consegue comprar alimentos, o resultado é contraproducente. Programas com descontos significativos nos juros e parcelamentos longos, mesmo com valores menores, tendem a apresentar taxas de recuperação muito superiores.
O timing das ações de cobrança também precisa ser repensado. Estudos mostram, por exemplo, que contatar um trabalhador formal logo após o recebimento do salário gera resultados muito melhores do que abordá-lo no final do mês. Utilize algoritmos para identificar os melhores momentos para cada perfil de devedor.
O futuro da recuperação de crédito: preparando-se para novos cenários
O horizonte da recuperação de crédito no Brasil aponta para transformações significativas, em que será preciso equilibrar tecnologia e empatia para navegar neste cenário de 70 milhões de inadimplentes.
Enquanto big data e inteligência artificial se tornam requisitos básicos para otimizar suas estratégias, paradoxalmente, o fator humano ganhará nova importância em um mercado onde muitos consumidores mal conseguem manter o básico.
Assessorias de cobrança tem agora a oportunidade de evoluir de simples “prestadora de serviço” para “consultora estratégica” de seus clientes. Ao oferecer insights sobre o comportamento dos devedores e contribuir para o aprimoramento das políticas de crédito, será possível conquistar espaço privilegiado em um setor tradicionalmente pressionado por custos.
Lembre-se: o problema do endividamento no Brasil tem raízes estruturais, mas sua empresa pode ser parte da solução ao equilibrar resultados de curto prazo com uma visão sustentável de longo prazo.