* Por Eduardo Tambellini
A inadimplência no Brasil vem sendo destaque semanalmente nos noticiários devido ao recorde de consumidores negativados. Pesquisas como da SERASA/Experian e da CNDL/SPC mostram um número superior a 71 milhões de CPFs. Este número representa 46,8% da população adulta.
Em um momento em que se fala tanto nas relações Brasil e Estados Unidos, resolvi trazer uma visão da cobrança no Brasil e nos EUA.
A inadimplência é um desafio nos dois países, com aspectos bem diferentes e com questões bem particulares. Vamos ver um pouco sobre estas diferenças:
Regulamentação e Proteção ao Consumidor
Enquanto no Brasil as relações de consumo e as principais regras do que se pode ou não fazer estão reguladas pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), nos EUA a regulamentação acontece pela Fair Debt Collection Practices Act (FDCPA) de 1977, que estabelece limites como horários autorizados de contato e proibição de assédio.
Tanto o CDC no Brasil como a FDCPA nos EUA protegem e defendem os consumidores e possuem penalidade que podem ser aplicadas em cobranças indevidas e violações com multas e sanções.
O Tamanho da Inadimplência
Por sermos brasileiros e ainda por SIM, termos a tal “síndrome do vira lata”, temos sempre o viés de colocar o Brasil no auge dos problemas. É, sim, fato que o Brasil tenha uma inadimplência significativa. Hoje, quase 30% das famílias possuem dívidas em atraso e quase 3% dos empréstimos pessoais estão em atraso acima 90 dias, influenciados por inflação e juros elevados.
Nos EUA, a inadimplência não deixa de ser um problema. A inadimplência de consumo está em torno de 2,8% no geral, porém alguns segmentos, como por exemplo o crédito estudantil e despesas hospitalares, entre famílias de renda mais baixa, apresentam níveis muito mais altos entre 7 e 12%.
Abaixo, um resumo dos principais produtos e da inadimplência em cada um dos países:
Produto |
Brasil |
EUA |
Cartão de crédito |
Mais inadimplente, juros altíssimos |
Alta inadimplência em subgrupos |
Empréstimos pessoais |
Alto risco fora do consignado |
Em expansão pós-pandemia |
Estudantil |
Pouco Relevante e FIES sem informações divulgadas |
Forte inadimplência (~7,7%) |
Veículos |
Crescente |
Subprime com inadimplência elevada |
Hipoteca |
Menor volume, mas com riscos |
Estável, sem crise ainda |
Serviços essenciais(utilities) |
Boletos atrasados muito comuns |
Menor incidência em crédito formal |
BNPL / parcelados |
Ainda pouco consolidado |
Crescente risco de inadimplência |
A Cobrança em si
Existem inúmeros processos no Brasil – somos referência mundial. Nosso sistema financeiro e de pagamentos é extremamente evoluído. Tente pagar algo em alguns países: peça um boleto ou um código de barras por exemplo. Vão te dizer: “O que??”.
A Cobrança no Brasil, indiscutivelmente evoluiu muito, mas ainda existem questões que dificultam a cobrança e principalmente a retomada de bens. A Cobrança no Brasil começa por telefone, ainda existem cartas ou email, no caso de não se conseguir uma negociação, em alguns casos, dependendo inicialmente do valor e tipo de dívida, ingressa-se com ação judicial, processo este que tem uma característica de ser lento e burocrático. A prescrição da dívida varia entre 1 a 5 anos, conforme tipo da dívida/produto de crédito.
Aqui temos algumas diferenças importantes. Enquanto no Brasil vemos um processo de cobrança amigável até mais robusto com ações digitais, portais de autonegociação, os EUA se caracterizam por um processo extrajudicial que pode ser iniciado por cobradores licenciados, porém, existe uma legislação que além de limitar horários e números de contatos, permite contestações pelo devedor para suspenção das ações.
A cobrança judicial, porém, é mais célere em muitos casos, com possibilidade de incluir “garnishments” – quando um tribunal autoriza o credor a retirar diretamente uma parte do salário ou da conta bancária do devedor para quitar uma dívida.
O Impacto no Crédito
O Brasil vem evoluindo há alguns anos no conceito da cobrança impactar o histórico de crédito em geral e não apenas gerar um apontamento negativo. Esta é a característica na grande parte dos países, ou seja, a cobrança não atua como no Brasil com apontamentos negativos que incluem o nome do devedor em cadastros negativos (SPC/Serasa) e esta acaba sendo uma forte ação de pressão.
Nos EUA existem três principais bureaus (Equifax, Experian, TransUnion) que registram dívidas públicas, porém com uma visão diferente de uma negativação. Dívidas não reconhecidas nos EUA aparecem como “derogatory remarks”, afetando o FICO Score, o grande instrumento que permite ao consumidor obter crédito sendo assim limitado o acesso a crédito e serviços.
Resumo dos dois países
Tenho estudado bastante as diferenças da cobrança de dívidas e todos os aspectos que envolvem a cobrança entre Brasil e EUA, um de meus objetivos é evoluir a Tabelando para os EUA e para isso, sem dúvida, é preciso estudar muito o mercado.
Abaixo busquei um comparativo entre os dois países em uma série de aspectos. Segue:
Fator |
Brasil |
Estados Unidos |
Quem leva vantagem |
Velocidade judicial |
Lenta |
Mais rápida |
EUA |
Execução de bens/rendas |
Limitada |
“Garnishment”direto |
EUA |
Custo da cobrança judicial |
Mais barato |
Mais caro |
Brasil |
Acesso a birôs de crédito |
Fácil e eficaz |
Também funciona |
Empate |
Eficácia extrajudicial |
Alta com pressão |
Alta se bem estruturada |
Empate |
Cultura de negociação |
Emocional |
Racional |
Contextual |
Conclusão
Com base no quadro acima, concluímos que cobrar nos EUA é mais ágil, eficaz e poderoso judicialmente, principalmente pelo “Garnishment” (bloqueio direto de salário ou conta).
No Brasil, entretanto, cobrar no Brasil é mais barato, mas mais lento e limitado em termos legais e de execução patrimonial.
Nos dois países e nos dias de hoje o foco em um processo inteligente com profissionais treinados, capacitados e motivados e com estratégias ideais para cada tipo de dívida, valor e perfil do consumidor é o que fará a diferença.
Para isso existe a Tabelando, para apoiar os mercados a extraírem sempre o melhor em cada um de seus processos.